Thursday, July 12, 2007

Proibidão


Saí de casa muito cedo, pelo menos para mim era muito cedo. Aos dezessete anos já morava em minha primeira república. Não senti medo com a idéia, na verdade ela sempre me seduziu.
Sair das asas dos pais, passar a ser conhecido pela primeira vez como eu mesmo, não como filho de alguém. Além de tudo, estava me mudando porque iria começar minha faculdade.O tempo de colégio, de adolescente, tinha ido embora. Pela primeira vez me sentia responsável. Talvez responsável seja uma palavra forte, mas com certeza eu já me considerava um adulto.
Minha mãe conhecia a mãe de um dos moradores da república e tinha me apresentado a eles. Conheci os dois caras, muito gente boa, mas como tinha sido uma apresentação formal,não deu para ver como era a rapaziada de verdade.
Quando chegava da faculdade sempre sentia um cheiro estranho no ambiente, parecido com defumação, mas meu colega que estudava de noite falava que a vizinha do andar de baixo era macumbeira. Não gostava da vizinha em questão, pois assim que tomei meu primeiro trote e cheguei todo pintado e fedido em casa, cruzei com ela pela escada e ela me deu o maior sermao, dizendo que eu estava sujando as dependências do condominio e blábláblá. Depois de saber que ela era macumbeira passei a tratá-la com certo respeito. Nunca fui chegado a pragas e mau-olhado.
Certo dia, cheguei em casa mais cedo e encontrei meu colega de república e um cara meio surfista no meio da fase de preparação de um cigarrinho diferente. Pelo cheiro, já tinha havido uma sessão antes.
Com o Bob cantando a plenos pulmões na sala, o pessoal só me notou depois que eu havia notado o flagrante, aí não restou outra alternativa a não ser me convidar para o ritual.
Depois que o surfista entregou o bagulho bem moidinho ("dechavado") pro amigo meu, vi que ele realmente tinha o dom. Tinha nascido para isso. Enrolava o cigarro com maestria e em um minuto ele preparou um baseado KingSize a prova de choques de até 100 metros. Podia arremessá-lo na parede que ele continuava compacto. Meu amigo teria vaga cativa na Philip Morris.
Acendemos o beque e começamos a fumar. Eu que nunca gostei de cigarro tive certa dificuldade, porque nem sabia tragar direito. Nas primeiras três bolas (tragadas) nao senti nada, mas na quarta. Ah, a quarta...
Não era muito chegado a reggae nao, mas o som tinha começado a ficar muito bom. De repente parecia que eu podia senti-lo através de todo o meu corpo, nao apenas com os meus ouvidos. Comecei a reparar na letra, meu inglês nunca tinha sido tão bom, pois eu conseguia enteder toda ela.
Meu olfato tinha ficado super potente. Quando cheirava minha mão, sentia como se ainda estivesse fumado o beque, que nessas horas já tinha ido todo para a mente da moçada.
Nessa hora o surfista falou que ia pegar um rango na geladeira, não sei bem o porquê, mas achei essa declaração muito engraçada e pelo visto não foi só eu que achei, porque nós três começamos a rir sem parar.
A partir desse dia, voltei a encarar a vizinha do andar de baixo sem medo.

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