Wednesday, July 4, 2007

Prólogo

No colégio onde estudava existiam 3 tipos de pessoas: os admirados que todos os garotos e garotas gostariam de ser ou de estar perto, os ignorados, que ninguém lembrava deles ou percebia sua presença e os rejeitados aqueles que ninguém queria ser visto junto. Eu, particularmente, me encaixava no último grupo.
Minhas expectativas nem eram tão grandes, sonhava apenas em passar despercebido pelo pátio durante o recreio ao invés de ter que fugir dos garotos que sempre me perseguiam pra me dar porrada.
Segui minha vidinha mundana até a festa junina da sexta série, quando encontrei com Fabiana. Fabiana, Fabi para os íntimos (o que definitivamente não era o meu caso), era uma gatinha da turma e pertencia ao grupo dos admirados. Não era uma fêmea alpha, mas estava entre as 5 melhores da turma, uma fêmea beta e assim sendo, era muita areia pro meu caminhão. Pra falar a verdade qualquer menina do colégio já era considerada muita areia pro meu caminhão.
Aquela noite prometia, ia chegar na festinha e tentar quebrar meu recorde pessoal. Tomar duas caipirinhas inteiras antes de voltar pra casa passando mal. Estava empolgado.
Quando cheguei na barraquinha de biritas vi Fabi. Como de costume não a olhei diretamente nos olhos e fiz cara de quem não a conhecia, afinal, desde a segunda série eu já ocupava o cargo de rejeitado. Já sabia muito bem como o sistema funcionava.
Pedi uma caipirinha para a tia da barraca e ouvi um oi de Fabi que olhava na minha direção. Olhei para todos os lados e não vi ninguém além de mim e da tia da barraca lá. Nesse momento tudo ficou claro para mim. Fabi estava falando sozinha.
Fabi, então, insistiu - "Oi Leandro". Naquele único segundo vi todos os momentos marcantes de minha vida passarem diante de meus olhos. Nunca um segundo tinha passado tão depressa.
Fabi sabia o meu nome. Fabi sabia o meu nome e tinha me cumprimentado. Fabi sabia o meu nome, tinha me cumprimentado e eu mijei nas minhas próprias calças. Tirando a parte de mijar nas calças tudo era novidade para mim.
Diante de uma oportunidade dessas pensei em várias coisas inteligentes para dizer. Como não é muito do meu feitio dizer coisas inteligentes, teria que plagiar algo que já tivesse lido ou ouvido.
Lembrei me das poesias de Vinícius de Moraes, das lições de filosofia de Jostein Gaarder e de "4 semanas de amor" de Luan e Vanessa, para finalmente dizer:
- "O-Oi, F-Fabi."
Conversando nos entendíamos perfeitamente, um completava o outro. Ela não tinha nada na cabeça e eu não tinha nada a perder. A noite passava sem ser notada por nós. Risadas aconteciam espontaneamente, embora o copo de caipirinha ainda estivesse completamente cheio.
Senti que o grande momento se aproximava. Percebia que meus sentimentos eram correspondidos por Fabi e iria beijá-la. Eu já tinha certa experiencia, conhecia beijos assistindo "Vereda Tropical" e já tinha visto minha babá em momentos íntimos com o porteiro pelo buraco da fechadura. Decidi então partir para o abate, mas Fabi previu minhas intenções e começou a esquivar-se. Podíamos ficar dançando esse mágico balé até o fim dos tempos, ou até que o copo de caipirinha derramasse em seu vestido. A segunda opção aconteceu primeiro.
Fabi desaparecia chorando rapidamente e levando com ela dois preciosos bens meus: meu coração em pedaços e a minha caipirinha em seu vestido.
No dia seguinte e nos outros que seguiram, fui motivo de chacota. Até que isso não era de todo o mal, afinal melhor ser sacaneado do que tomar porrada, mas Fabi nunca falou comigo novamente.
Essa experiência foi muito trágica para mim. Até então a coisa mais triste que tinha visto tinha sido a morte da mãe do Bambi. Algo tinha acontecido dentro de mim. Daquele dia em diante eu me tornei uma pessoa má e amarga. O medo enfim vencera a esperança.

4 comments:

Bruno said...

Cara, muito bom!!! Você deveria ter começado com essa idéia do blog mais cedo...

Bruno said...
This comment has been removed by the author.
Bruno said...

Agora eu descobri a origem da amargura. O mundo só ajudou a tornar tudo pior...

Ogro said...

Esse post começou me dando raiva, depois torci pelo protagonista e terminei rindo da sua desgraça.
Muito bom. Flui rápido e verdadeiro.